Sexta-feira, 29 de novembro de 2024 - Por Rafael Brandão
"Conexão da universidade com maioria da população", diz Ademir da Silva sobre o NEAB
Ademir José da Silva é advogado da OAB Campinas e tem uma longa história de ativismo em prol da cultura afro-brasileira
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Ademir José da Silva. Foto: Rodrigo Zanotto.

Sentado na primeira fila do auditório do Centro de Convenções da Unicamp, o advogado Ademir José da Silva contemplava a cerimônia de inauguração do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da Unicamp (NEAB), no dia 21 de novembro, quando foi citado pela professora Débora Jeffrey - em aula magna sobre a história da criação do novo órgão, que remonta a décadas atrás - como um dos nomes de referência na trajetória dos movimentos negros na universidade e na região. Como representante da OAB Campinas, Ademir participou ativamente do Grupo de Trabalho que resultou na criação do NEAB - órgão com o qual continua colaborando como membro do Conselho Superior. Embora não tenha sido estudante da Unicamp, ele considera que seu histórico de luta "se confunde com a história da universidade", pois teve proeminência em algumas das principais iniciativas relacionadas aos movimentos negros na comunidade acadêmica, à exemplo da criação do Grupo de Estudos Afro-Brasileiros (GEAB), precursor do NEAB, em 1987. Atualmente, preside a Comissão da Verdade sobre a Escravidão Negra no Brasil e a Comissão de Direito e Liberdade Religiosa na OAB Campinas. Integra ainda movimentos de ressignificação de espaços históricos associados à escravidão, como os trabalhos da Casa de Cultura Fazenda Roseira, hoje administrada pelo grupo Jongo Dito Ribeiro. -- Qual o significado da inauguração do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (NEAB) na Unicamp? Para mim, o NEAB é como o baobá, uma árvore africana centenária que simboliza a resistência e a longevidade. Sua inauguração é o resultado físico e material da luta de todos aqueles que vieram antes de nós e que, de uma forma ou outra, espalharam simbolicamente as sementes desse baobá, que ganhou registro formal e permanente na estrutura administrativa da Unicamp. Representa uma conexão essencial entre a universidade e a maioria da população brasileira, formada por negros, pretos e pardos, que somam 56%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Além disso, expande as oportunidades de interação com o continente africano no desenvolvimento de pesquisas, intercâmbios e parcerias. Como foi sua atuação no Grupo de Trabalho referente à criação do NEAB? Tive a oportunidade de participar ativamente na materialização do sonho da criação de um órgão robusto e institucionalizado na estrutura da Unicamp. Para mim, foi uma experiência extraordinária. Agora, como membro do Conselho Superior do NEAB, sigo comprometido em contribuir. As expectativas em relação ao futuro do núcleo são as melhores possíveis, no sentido de dar suporte e continuidade às iniciativas anteriores, nas áreas das artes, cultura e educação - e a partir de agora, possibilitando a intersecção com todos os campos de atuação da universidade. Fale um pouco sobre sua trajetória no ativismo e na Unicamp. Minha luta se confunde com a história da universidade. No final da década de 1970 e nas décadas seguintes, reuníamos alunos negros no Clube Machadinho, que eu presidia na época, local de lazer e cultura da comunidade negra localizado na Vila Industrial. Ali, chegavam alunos negros da Unicamp, em sua maioria estrangeiros, africanos da diáspora negra, além de um ou outro brasileiro de pós-graduação. Lembro do falecido professor Jonas Romualdo e do professor João Vilhete, à época estudantes. As professoras Raquel Trindade e Inaicyra Falcão, que atuaram no Instituto de Artes. A professora Lucila Bandeira, que coordenou o Grupo de Estudos Afro-Brasileiros (GEAB) junto ao Centro de Memória, do qual fui um dos fundadores, em 1987. Também tive a oportunidade de fazer parcerias com a Unicamp enquanto dirigente da Delegacia do Conselho da Comunidade Negra em Campinas e Região, quando desenvolvemos, em parceria com a Faculdade de Educação, um curso pioneiro chamado "O Negro e a Educação no Estado de São Paulo". Quais momentos marcantes dessa história você destacaria? Um evento inesquecível foi a comemoração do centenário da abolição da escravatura, organizada em 1988 pelo GEAB. Chamado de "Kizumba Unicamp", foi uma atividade extraordinária que reuniu grandes nomes, como Martinho da Vila e muitos outros expoentes, inclusive a então presidente da Mangueira. Foram realizadas palestras, apresentações e celebrações que marcaram a história da universidade e estão registrados no Centro de Memória da Unicamp. De forma mais ampla, como avalia o papel das universidades e do meio acadêmico na promoção das pautas de combate ao racismo e valorização da cultura afro-brasileira? Considero de suma importância e salutares as iniciativas que visam atender às demandas, há quase meio século, dos movimentos sociais negros e da sociedade civil organizada, apontando como fator preponderante a desigualdade reinante na sociedade brasileira e, por consequência, também nas instituições de ensino, na contramão da igualdade material proposta pela Constituição Federal de 1988 e pelo Estatuto da Igualdade Racial de 2010. Isso posto, a criação do NEAB representa um avanço, inclusive pelo fato de ter sido estruturado de modo a perpassar todos os ramos da ciência, com uma perspectiva inovadora para a Unicamp.

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